quarta-feira, 23 de junho de 2010

Janela Fantasma



Estou atrás da janela, observando.
Daqui de cima, nessa sala vazia, eu não sou ninguém. Não há ninguém aqui para me lembrar qual é o meu nome, nesse momento, faço apenas parte de uma janela.
Vejo crianças, pré e pós-adolescentes, posso ver cada aluno ali, e posso ver todos ao mesmo tempo. Muitos circulam pelos pátios, muitos correm atrás de bolas pelas quadras de esporte.

Garotas, sentadas, fofocando, debruçadas no parapeito, rindo, brincando, correndo atrás de garotos,.
Garotos jogando, se empurrando, se chingando, rindo, brincando, correndo de garotas.
A menina dos cabelos louros, jogados sobre um ombro, de óculos delicado, parada ali, com cara de Julieta, esperando que algum Romeu enfim enxergue sua beleza, sua delicadeza.
Ela é bonita, mas nenhum Romeu liga, há muitos e muitas ali para se reparar apenas em uma, eles querem apenas correr e se divertir.
Mas ela espera...
Há muitas Julietas que esperam ali e há muitas Julietas que esperam em todos os cantos desse mundo...

Essa é uma escola grande, de muitas janelas e de dois andares. Escola velha, rústica, de mil oitocentos e sei lá quanto, imagino quantos fantasmas devem viver ali...
Penso se que há alguém lá em baixo me vendo aqui. Alguém que está ali no meio da agitação, parado, em silêncio, apenas observando e se perguntando o que aquela pessoa estava fazendo atrás da janela, feito uma estátua, e talvez esteja imaginando que eu também seja um fantasma.
Talvez esse alguém tenha razão...

Vejo um ou outro escorado pelos cantos da escola, inexpressivos, de olhares perdidos, parecem tristes e deslocados. Talvez estejam se perguntando o que estão fazendo ali e talvez sejam daquelas pessoas cujas quais são taxadas de nerds ou fracassadas nesses filmes americanos, sabe?
Não, não, acho ninguém me vê aqui, quem naquele turbilhão olha para cima e repara em uma janela em meio a tantas outras?

Há uma faixa no vidro da janela, parece um defeito, toda vez que meu olhar passar por ali, a imagem lá de baixo se distorce, fica dupla, embaçada.
Então eu brinco. Olho daquele ângulo e escolho alguém lá em baixo para distorcer. Acompanho seus movimentos, e ela se torna a única distorcida na multidão.
Pergunto-me então como é sentir-se um deformado no meio da multidão.

Bate o sinal, mais parece um toque de recolher na detenção. O professor aparece, recolhe as bolas, algumas crianças reclamam, outras gritam de alegria, enfim o dia terminou.
Chega de aulas!
O formigueiro se agita, as formigas correm pegar seu material. Observo os corredores, repleto de deslocados e super-locados. Despedem-se, se empurram,saem em grupo fazendo bagunça e saem solitários de cabeças baixas.

Achei alguém deformado, perdido no corredor. Observa o movimento ao redor, tenta sem êxito participar daquele fluxo. Não estou olhando através da faixa com defeito, há mesmo alguém ali, baixinha, de rosto feio, ossos largos, olhos miúdos, óculos largo, meio torta. Esperando ser vista.
Gostaria de dizer a ela, que agora eu estou a vendo...
Ela reconhece alguém vindo em sua direção, é uma mulher de mais idade. Sorri um sorriso torto e desce cuidadosa a escada, meio capengando, e descoordenada vai-se embora de braços dados com sua possível e única amiga, e ao que se parece; sua mãe.

Muitos já foram embora, mas as vozes e os gritos ainda ecoam.
Hormônios, tédio, histeria, falta de atenção, tudo junto e bem misturado, ou quase.
Vejo a faxineira no segundo andar, fumando, num canto, com a vassoura do lado, silenciosa, introspectiva. Em que problemas estará pensando... Provavelmente também está aliviada, porque o dia acabou. Chega de limpar!

Aos poucos o povo se dispersa, e o silêncio discretamente se instala. As janelas do prédio começam a ser fechadas, as últimas varridas são dadas. Apagam-se as luzes, fecham-se as pequenas e grandes portas e os que carregam consigo os molhos de chaves dizem até amanhã, sobem em suas bicicletas e enfim vão embora.

O tempo fecha, escurece rápido, o vento zune perdido naqueles pátios vazios. Não há mais barulho ali, não há mais ninguém.

Na verdade eu já fui embora a dois parágrafos acima, isso quem me contou depois foi à própria janela da qual eu observava.
Disse que desde que foi construída ela vê aqueles jovens ali, ano vem, ano vai, velhos saem, novos entram, mas todos os dias eles fazem a mesma coisa. Apesar da aparência alegre e jovial, se parecem com fantasmas, os fantasmas da escola, perdidos no labirinto da mesmice hereditária.
E assim como todos, aquela janela, todo fim de dia, também diz ‘até amanhã’, só que ninguém a vê, ninguém a escuta e ninguém a responde.

Vai ver, até ela, mergulhada na rotina de seu nada-ser, não passa além de mais um fantasma...

12 comentários:

  1. Texto ótimo .. reflete um pouco da nossa vida cotidiana, o tempo sempre passa e passa e às vezes ficamos alienados naquela mesmice, com as mesmas obrigações, as mesmas tarefas e tal ..
    Gostei muito, parabéns .. =D
    beejo! ;*


    http://myriad-daydreams.blogspot.com/

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  2. Gostei do texto, é seu mesmo? parabéns pelo blog,,,

    to seguindo aki, se der faz o mesmo!

    http://deixakieto.blogspot.com/

    beijooos!

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  3. Obrigada! Nosso cotidiano pode nos mostrar muito... :)

    O texto é meu sim! não assino porque acho meio redundante rs

    Retribuo comentários sim, pode dexar ! :D
    Abrç!

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  4. Passando aqui por que gosto muito do seu blog e pra te fazer uma proposta de parceria, vamos colocar em nosso blog o link um do outro?

    Assim nos unimos para fazer propaganda de nossos blogs, se estiver interessado entra em contato.

    Abçs Brother!

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  5. Honestamente, não sei sob qual ângulo admiro seu texto. Se tento algo mais subjetivo, se tento ser mais reflexivo, ou se enfim, arrisco-me na objetividade de dizer: Parabéns, seu texto é uma delícia de ser lido!
    Tenho uma vontade de dizer que seu blog e seus contos merecem ser mais divulgados, mas não sei se teria palavras o suficiente para dizer o porquê dessa vontade.
    Talvez eu não precise de argumentos para provar para a dona do blog que seu próprio blog é uma maravilha!
    Mas saiba que você tem um leitor que admira muito o que você escreve :)))

    http://songsweetsong.blogspot.com/

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  6. eei... que texto liindOo!

    ^^

    parabeens pelo blog,estou te seguindo...
    www.paginasdeumvelhocaderno.blogspot.com

    ;)

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  7. aaah, que massa gente, obrigada!
    Chorei com teu comentário Gabriel ;') haha
    Admiração retribuída :D
    to sem tempo de ficar online, mas assim que der acompanho os blogs de vocês!!
    Caio entro em contato sim! valeu ^^
    Abrç!

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  8. seu link tá la no meu blog... é só escolher um banner meu e colocar aki no seu blog...
    abçs!

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  9. "Bem que dizem que gênios só são reconhecidos depois que morrem. :/" (Sobre Eliza Samudio)

    E eu que faço piada com defunto... eu ri dessa!!!

    Obrigado pela visita!

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  10. Ual seu texto é maravilhosa,eu com minhas poesias mixurucas que eu amo fiquei de boca aberta com seu texto,olha se puder entra em um de meus blogs,receber um comentario seu no meu post de poesia sera uma honra,se seu estomago aguentar entra no blog mico não.

    eu adorei seu blog,vou indicar no meu bjssssssss

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  11. INCRÍVEL!
    Quando eu crescer, quero escrever igual a você!

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  12. Olá, cheguei aqui indicada pela Ana Carla e curti muito! Parabéns! Você é 10! Beijos

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