domingo, 25 de abril de 2010

Os anjos foram embora!


Eu bem que tentei resumir, mas qual é a graça de reclamar se não pode contar tudo, não é mesmo? ;X

Incrível como algumas vezes pequenos incômodo podem te deixar a um nível altíssimo de irritação, sem deixar de transformar a situação em algo ridiculamente cômico.
Para mim é comum passar por isso principalmente durante a noite, quando a necessidade de dormir se torna torturante diante do um constante e crescente desconforto,cujo qual me impossibilita ter um sono realmente agradável.
Bom, para elucidar melhor do que estou falando tentarei narrar justamente a noite de ontem...

Tudo começa no momento em que me deito e me ajeito na cama a espera de um ronco celestial. É normal ficar pensando freneticamente em mil coisas aleatórias quando se deita, isso é para mim, um procedimento rotineiro até pegar no sono. O problema é quando no meio da profusão dos pensamentos eu percebo que há uma música tocando.
- Oh, que chick, tem até trilha sonora.

Ah, sim, imagine você um filme tocando a mesma música durante as suas duas longas horas de duração. Pior, tocando só o refrão dessa mesma música. Aliás, duplamente pior, imagine que essa música é uma daquelas que você ouve nessas rádios porcaria de dez em dez minutos ( e por mais que você mude de estação, ela sempre volta a tocar ), daquelas que sempre tem um vizinho chato ouvindo pelo menos uma vez por dia ( e muita das vezes cantando desafinadamente alto ).
Acho que não preciso nem ficar elucidando muito essa situação, porque ao que sei todo mundo passa por isso de ficar com a mesma música na cabeça, um, dois e até três dias direto...
Confesso que nem sempre o protagonista desse terror mental é um “Rebolation’’ da vida ou uma daquelas músicas gospel ( que chega a virar até pagode ), cuja qual nem sei o nome, mas que magicamente sei cantar até de trás pra frente: entra pra minha casa, entra pra minha viidaa, mexe com minha estruturaa, cura todas as feridas,láráláámemataa!!
Ás vezes é até uma música que eu gosto, mas que depois de horas repetindo ela quase sem parar, eu passo infelizmente a odiar.

A três dias atrás, por exemplo, ficou uma do Pink Floyd, dia e noite, e não sumiu mais ( só de mencionar agora, a desgraçada fica novamente ameaçando submergir do meu sub-consciente ).Inclusive, a música da vez foi ‘Morning Has Broken’ do Cat stvens.
- Ta, ta, to cagando pro teu gosto musical, anda logo com esse porre.

Pois é, a música é maravilhosa, tudo muito bonito, ficar repetindo ela 500 vezes é melhor ainda.
Então viro de um lado, viro de outro... Não, não, melhor ficar de costas mesmo. Hm... Puts, não, de lado é melhor. Tá, tá, do outro. Ê merdaa, de costas, de lado, do outro, de bruço, de costas, de lado, do outro...

-Mas putaa que o pariu, essa vai ser uma noite daquelas!
Penso logo, na minha magnífica inteligência intuitiva.

Isso porque além da música torrando a sutil paciência da minha cabeça, não há coisa melhor do que tensão no pescoço na hora de dormir.
Quando isso acontece (quase sempre) eu fico metade da noite virando de um lado para o outro (ta é exagero, mas tem dias que ‘metade’ é até eufemismo) e arrumando travesseiro, tentando achar uma posição que suma com o desconforto.

Ok, vamos colocar os fatos em claro.
Essa era uma noite que eu precisava mesmo dormir. Fui deitar era meia noite, depois de ficar um tempão fazendo exercícios de Bioestatística e estudando a porcaria do DNA. Eu teria uma prova de manhã e uma prova a tarde no dia seguinte, e como tenho que me deslocar de uma cidade a outra para estudar, tenho que acordar às cinco e cinqüenta da matina.
Então o desespero começa a crescer, eu realmente não queria dormir só às cinco e meia e levantar as seis horas pra ir fazer prova e na hora do cálculo ficar rabiscando debilmente Morning Has Broken na folha.

Não lembro o que houve, mas na minha ânsia de dormir eu acabei pegando no ronco lá pelas 2 :30.
Esse é um ponto que devo frisar na narrativa: é a terceira noite consecutiva que tenho sonhos curtos, com enredo besta exercido numa repetição desgastante. Acordo no meio da madrugada achando que o sonho é real, e assim como a música ele fica repetindo na mente várias vezes. É um estado entre dormindo e acordado, estou com um pé no sonho e um pé no desconforto de estar acordada.
O sonho horroroso que me fez acordar ontem, exatamente após apenas uma hora e meia de sono, foi uma coisa idiota, de um blog que eu tinha que atualizar, ou copiar um texto, e que não sei quem não podia ler, ou sei lá o que, não me lembro bem. Só sei que eu ficava virando de um lado para o outro, visualizando mentalmente eu mesma dando repetidamente ctrl+c e ctrl+v nuns textos colorido, acreditando que eu realmente tinha que ficar fazendo uma debilidade dessas.

Depois tanto insistir naquilo, aos poucos fui ficando mais lúcida e logo já estava totalmente fora do sonho. Mas ainda estava com sono e querendo mortalmente dormir.
É ai que eu chego ápice do meu incômodo.

Viro pra lá, pra cá, de costa, de bruço, nada adianta.
Viro o travesseiro, dobro ele, viro de novo, tiro ele- opa, ta melhor!*se passa um segundo* Ah, pff, já voltou a incomodar- então ponho, tiro, ponho e tiro.
O cabelo me irrita quase sempre, toda vez que eu viro ele se enrola na minha cara, no meu pescoço, se enrosca não sei a onde e começa a dar um calor chato. No escuro do quarto, me arrasto da cama e apalpo o chão a procura de meu rabicó, cujo o qual joguei por porto antes de me deitar. Na minha estabanação cega, esbarro nas garrafas de plástico que estupidamente deixo em cima do bidê, por pura preguiça de tirar, ai faz aquele barulho de escola de samba. Murmuro alguma desgraça, mas finalmente eu acho o que procurava. Amarro o cabelo de qualquer jeito e volto a deitar.
Viro , viro, viro, ajeito o travesseiro...Nada.
Aí me bate uma raiva desgraçada, agora o rabicó me incomoda também, arranco ele do cabelo.
Eu já nem tenho muita afeição por meu cabelo, nessas horas em que a revolta é crítica, eu fico tão irritada, que eu quero cortar ele fora. Só não o fiz naquele momento, porque lembrei que ia ter que levantar, acender a luz, abrir a gaveta e procurar a dianha da tesoura, até lá já teria passado o fervor da raiva. Ah, mas se a bendita estivesse ali por cima eu voava nela arrancava essa juba de vez e ainda por cima de tão alucinada, ainda furava meu olho. haaaaaha

Puts que o pariu, viu.

Tem outro lance que me incomoda demais. De noite me bate uma sede do inferno, eu até levo garrafinha com água e deixo no surdo-mudo do lado da minha cama. Sou obrigada a ficar bebericando o tempo todo, e conseqüentemente sou obrigada a levantar para ir ao banheiro de trinta em trinta minutos. Tenho que atravessar um corredor que acende a luz automaticamente toda vez que passo (odeio essa luz), e sempre acabo fazendo barulho suficiente pra perturbar o sono dos outros lá em casa.

Então, mais uma vez volto e deito, me cubro, descubro, lençol, coberta, lençol, bate calor viro de um lado pro outro, cabelo enrosca, muda o travesseiro, sede, vontade de ir ao banheiro, dor no pescoço, sede de novo, banheiro, prova, prova, prova, dormir, dormir, dormir.
Nada adianta.

Sem suportar mais, levanto derrotada para abrir a janela e fazer circular o ar. Está chovendo lá fora, e até isso me irrita, até o adorável barulho da chuva.
Aí desisto de tentar dormir. Como não tenho paciência pra ler nessas horas e não sei o que fazer, vou escrever. Olho as horas, já é cinco e dezoito da manhã, os galos dos vizinhos distantes estão cantando desde as quatro, só faltam trinta e dois minutos para o despertador tocar.

É um verdadeiro Vietnã, eu contra eu, eu contra a cama, eu contra tudo.
Estive pensando, ( eu sempre penso isso mas nunca lembro de fazer ) acho que vou trocar a cama de lugar, ouvi falar que há diferentes energias em diferentes pontos da casa, quem sabe eu fui colocar a cama bem em cima da chaminé invisível da casa do capeta, e ele ta fazendo maior churrascão lá.. He he
Ah, vou fazer ioga tambérm, quem sabe em estado alfa,beta,gama, minha mente sossega.

Só sei que quando eu era criança eu não passava por isso . ¬¬
Acho que porque minha mãe ao dar boa noite ainda dizia ''durma com os anjos'' e eu acreditava.
Anjinhos volteemm, venham ninar meu sono , snif.

Agora, só pra saber, alguém mais aqui passa por isso?

segunda-feira, 19 de abril de 2010

Isolado

Hoje sentei na porta para espairar as idéias e comer uma maçã. Dali eu podia ver toda uma praça e as ruas ao redor dela, poucas pessoas circulavam e quase nenhum carro.
Era uma segunda à tarde, dia agradável, ensolarado, hora em que a maioria está trabalhando.
Comecei a reparar no que estava acontecendo em volta para ver se achava algo interessante que me distraísse enquanto mordia sem pressa a fruta suculenta,nham,nham.
Em questão de segundos minha atenção se deteve em três garotos sentados num banco da praça, pareciam típicos meninos de 13 anos, riam, conversavam expressivos e olhavam ligeiro o movimento ao redor sem prestar atenção em nada.
Passado o momento, meus olhos correram para o banco ao lado, um pouco mais afastado. Estava sentado ali outro menino da mesma idade, porém este era gordo.

Aparentemente parecia estar sobre o tênue limite que separa uma obesidade padrão de uma obesidade mórbida.
Estava sozinho e parecia triste, ou pelo menos melancolicamente introspectivo, coisa que dificilmente se vê em garotos dessa idade saudavelmente agitados.

Então, após observá-los por um tempo, sem querer fui comparando a contradição do que eu via: de um lado, garotos normais, felizes, seguro de si, rindo entre amigos ou falando qualquer bobeira comum entre pré-adolescentes, e, do outro, aquele garoto gordo, calado, isolado, triste e cheio de inseguranças.
A oposição de ambas as realidades me fez pensar o quão parecia cruel esse aspecto das diferenças. Aqueles garotos pareciam tão bem, enquanto que o outro, sem culpa, deve ter nascido em alguma dessas famílias ansiosas que induzem seus filhos desde muito cedo a comer, comer e comer. E mesmo sem querer, acabam depositando suas ansiedades e frustrações nessas novas gerações.

Bom, ali parecia estar um dos resultados dessa educação caótica: inerte, preso em seus complexos, sem a beleza aparente da espontaneidade.

Eis que no meio das minhas reflexões, os três garotos se levantam, mas ao invés de ir embora, apenas vão sentar em outro banco, cujo o qual se encontrava de costas para mim. Provavelmente estavam escapando do sol que batia forte onde antes haviam sentado.
E para minha surpresa, estes fazem sinal para o garoto gordo, falando algo que eu não podia ouvir, mas visivelmente o chamando com naturalidade para juntar-se à eles.

O garoto se levanta e vai em direção, rindo meio constrangido, com a disposição preguiçosa de alguem que obedece uma ordem corriqueira. Vejo sua boca se mexer, respondendo aos outros, trocam algumas rápidas palavras e o gordinho fica em volta deles. Aos poucos voltam a conversar, trocam frases soltas, e o garoto gordo fala alguma ou outra coisa. Então me ocorre afinal que eles eram amigos e estavam juntos. Por um momento chego a acreditar que tudo o que eu havia pensado em relação a diferença entre os garotos, estava errado, precipitado, ou preconceituoso. Que a amizade deles era livre,sem preconceitos, sem exclusão, que transpunha as diferenças físicas, o que aparentemente ou ideologicamente acontece nas amizade entre crianças.

Só que isso durou alguns instantes, tempo suficiente para voltar a perceber que afinal o diferente dificilmente se adaptará ao que aparentemente é normal.
Os garotos são espaçosos no banco e o garoto gordo não pode sentar-se com os amigos, pois não cabe ali. Eles também não fazem o mínimo esforço para oferecer um espaço ao colega.
Este acaba ficando em volta, e tão logo pára de participar da conversa. Anda pra lá e pra cá, procurando um lugar para se sentar por perto, tenta nos arcos de ferro que separam o gramado da praça, mas o famoso 'cofrão' fica a aparecer e incomodado se levanta. Enfim senta-se no chão , encostado numa palmeira atrás do banco, se ajeita ali e parece escutar o que dizem, as vezes rindo discreto, tenta participar da conversa mas sua voz não se impõem o suficiente, então volta a se afundar em sua apática introversão.
Novamente vejo que por um momento me enganei com pensamentos ingênuos de igualdade, de fraternidade, aceitação das diferenças, quéco, quéco, quéco e coisa do gênero.

Sim, ele estava junto, mas continuava de certa forma, sozinho.

Passaram um tempo ali e enfim decidem ir caminhar. O gordo levanta desajeitado e passa a segui-los andando ao lado. Os três trocam tapas e chutes leves de brincadeira enquanto andam, ele ri sem extravagância, mas ninguém dá tapas e chutes no garoto gordo, por quê? Ele apenas olha e ri, num distanciamento de quem é tímido demais pra participar.

A culpa dessa exclusão não parece ser dos garotos distraídos e nem do garoto gordo que não consegue se envolver nas brincadeiras... Então, comigo eu me pergunto: a culpa é dos seus pais? ou dos pais dos pais? A culpa é da sociedade? dos padrões que ela impõem? A culpa afinal é de quem?

A quem poderíamos culpar, para justificar o triste ar de vítima que aquele pobre garoto tem?

De quem ele é vítima?

É, a crueldade da realidade pode ser sublime, mascarada, mas existe. Existe dentro de cada um.

Talvez, aquele garoto seja muito novo para entender, mas quem sabe um dia, quando ele deixar de sentir tristeza e passar a sentir revolta por ''não ser como os outros'', ele possa perceber que afinal, não se pode culpar a ninguém por isso.
Creio que os únicos culpados, afinal, somos nós mesmos, por aceitarmos passivos o papel ridículo de vítimas...

Aos poucos vejo se afastarem os quatro naquela relação parcialmente mútua de descontração.
Desejo em pensamento que aquele triste garoto um dia possa ser assim também, não por um momento, mas dentro de si, de si para si, descontração íntima e mútua...

Dou a última mordida, mastigo e engulo.

Não sei mais o que pensar.

Levanto, me estico e entro para escrever.

domingo, 18 de abril de 2010

Depoimento

Coisas que quem está dentro raramente desabafa, e quem está fora faz vista grossa, mas um dia acaba descobrindo por si próprio, talvez tarde demais.

“Hoje é sábado, penúltimo sábado de janeiro de 2010.


E esta sou eu.

Quarenta e oito anos, um filho de um ano e meio, uma filha de dezoito ...

Sempre fui uma pessoa alegre e otimista, e hoje olha como eu sou... Triste.

Eu sou uma pessoa triste. É, eu sei o que é ser uma pessoa triste.

É...

Sempre dependi e defendi meu mundo privado para reanimar, para ter energia, para realimentar minha alegria. Sempre tive a fantasia de família, hoje, minha família são meus filhos, meu marido é um estrangeiro, turista acidental.

O mundo dele, é o mundo dele. Uma mulher não pode ter o privilégio de participar do mundo dele, de um homem.

O filho dele participa porque é homem.

E se fosse uma menina? Como seria a relação? Haveria esse amor todo?

Hm? Será?

Afinal, o menino é a imagem e semelhança dele. Ai se não parecer com ele! Se por acaso parecer com qualquer outro que não com ele.

Hm... Que amor narcisista, nossa, que amor narcisista...

*Instante de silêncio*

To feia né?

É, eu tô feia, tô muito feita. A feia.

Feia, velha e triste.

Eu sou feia. Bem feia. Muito feia.

Hm... *Suspira*

Mas Deus é grande, e eu vou dar a volta por cima, questão de tempo.

É...Um dia tudo isso vai passar, eu vou perdoar, nem vou relembrar.

Eu tenho um filho lindo, uma filha linda e uma casa linda,* Observa e admira a casa *, minha casa linda.

Hm...

É... *Olha ao seu redor*

Meu quintal, meu quintal, cheio de mato, tem que roçar, dá trabalho. E daí? Filhos também dão trabalho...

*Suspira novamente*

Ah, quer saber?

Chega.”

-Anônimo

Qualquer semelhança com a realidade , não é mera coincidência.

segunda-feira, 5 de abril de 2010

Vento


Tentava estudar, escrevia, escrevia, copiava, definia, anotava observações, linhas, entrelinhas.
Mas uma estranha sensação de vazio, um encômodo pertinente dentro de si a impedia de dar o máximo de si para compreender os ditames acadêmicos. Sua mente tentava se concetrar, mas seu coração estava distante.
Era como um buraco negro.

Aquele sentimento lhe trouxe uma tristeza estranha que lhe fez perceber aos poucos o quanto inúteis eram as classificações, definições e decorebas de todo o dia.
A luz do computador ja encomodava a vista e lhe dava enjoo.
A cortina esvoaçava violenta, rechicotiando contra o ar e contra a janela, ar , janela...

Um ser envolvente urrava do lado de fora.
Movimentava tudo o que estava parado; as árvores dançavam, os cabelos alheios esvoaçavam para todos os lados, papeis alçando voo, levanta-se o pó.

Era o vento.

Ele a chamava, ela sentia isso, ela sabia.
Há muito tempo sentia, mas achou que boicotar era o mais prático, não queria embarcar em tolices que nao a levariam a lugar nenhum.
Ela tinha que estudar, se formar.

Mas o Vento incansavelmente a chamava.

- Chama, chama...- repetia ela como uma voz incômoda que ecoava em sua cabeça.

Promete arrancar tudo ao redor e levar embora, se ela não for vê-lo.

-Ah, suspirou desanimada, chega de resistir.

Aquele buraco a tomava por dentro ja havia tanto tempo, parecia eterno, estava cansada de lutar contra isso. Que sucumbisse então, pensava melancólica.

-Chega...

Enfim se levanta, larga os papéis, larga as canetas, o brilho da tela, classificações e definições.

Caminha vazia até a porta, destranca, abre-a .

A claridade entra. Não há sol. Há nuvens escuras, vento forte e tudo ao redor fora do lugar. Ela se joga, se entrega com a devoção de uma suicida.
Uma rajada de ar a invade, forte e implacável.
Não há mais resistências.
Então um turbulhão se instala e movimenta todo seu ser, limpa sua mente; e seu corpo, sem peso, flutua...
Depois, o vento se acalma, as nuvens se dissipam e tudo volta em seu lugar.

A tristeza vira calma.

Agora ela entende, sente enfim, que não há nenhum buraco negro.
Há sim um vazio, dizendo o tempo todo para seu coração distraido, que toda ela era isso: esse turbilhão e esse silêncio.

E que se quisesse podia viver um turbilhão no silêncio,

e encontrar o silêncio num turbulhão.

sábado, 3 de abril de 2010

Beleza perdida


No topo daquela árvore, há um animal perdido.

Ele chama pelos semelhantes com gritos ritmados, sons surdos metalizados, procura alguém com quem possa dividir a dor da solidão.

Os galhos balançam leves, empurrados pela brisa fria da manhã, uma manhã insensível para com os que estão desamparados.

As folhas cintilam frenéticas, embaladas pelo canto mecânico do tucano solitário.

Em torno se reúnem passarinhos, pequenos pardais, que, em muros, antenas e galhos, acompanham com expectativa, distantes e curiosos o ritual miserável, daquele pobre deslocado.

No silêncio de sua insignificância, esses pequenos alados agora se deliciam ao presenciar uma ave grande, de cores e bico imponente - dessas que vivem exibindo sua beleza em vôos altos e coletivos - se lamentar durante horas o infortúnio de isolar-se em sua própria espécie, em sua própria exuberância. Pois agora se encontra perdido do bando em terra estranha e sequer pode pedir ajuda aos reles e insonssos pardais; já que estes,por conta de sua simplicidade vulgar, nunca foram dignos de relacionar-se com as belas aves.

Impotente, só lhe resta ganir rasgado na esperança de que algum outro distante tucano egoísta ouça sua súplica triste e orgulhosa.

‘Não há nada que sua beleza possa fazer para te ajudar agora, não é?’ pensam com malicia os recalcados passarinhos marrom-sem-graça.

Certo estão eles, pássaro cego, esse que, na sua prepotência e arrogância, acha que vai se salvar.

Tolo.

Mal sabe ele que seu canto e beleza que tanto o elevou no pedestal do seu ego, agora está atraindo a atenção de homens gananciosos, os quais preparam-se para capturar e jogar a ingênua ave na gaiola fria de seu triste destino...

Pobre ave, que futuramente cantará sem vida afundando-se sem esperança preso no viveiro de algum estranho.

Ou, empalhado , enfim, em um verdadeiro pedestal, será admirado de relance por um ou outro que por ali passar...

...Sem nunca mais cantar...


Ah tucaninho,



os pardais bem que sabiam;



a beleza fez sua caveira !