segunda-feira, 7 de junho de 2010

Ciclo de vida

Estranho é o ser humano.
Durante meses ele vive o paraíso de sua existência, dentro da barriga de sua mãe.
Lá ele tem tudo o que em vida ele poderia querer; conforto e proteção. Desprovido de ambições e pensamentos, ele apenas se afoga no prazer de nada precisar fazer, e isso incrivelmente não lhe dá tédio.
Envolvido por um casulo de calor e amor, sua missão é apenas ali estar até que chegue sua hora de vir ao mundo.
Então essa terrível hora chega.
A indefesa criatura é arrancada da sua mais pura fonte de vida, mãos frias o puxam sem dó, tirando-o a força do único lugar em poderia querer estar, cujo qual ele logo desejará inconsciente e incansavelmente estar novamente.
Seu lar calmo, pequeno e escuro é substituído por um mundo vasto, barulhento e irritantemente iluminado.
Em breve sua mente crua estará cheia de monstros, complexos e traumas.
A conhecida escuridão que a pouco era calmaria para ele, logo será sinônimo de medo, perigo e solidão.
E a solidão com tempo se tornará umas de suas maiores e desconhecidas inimigas.
Nela ele projetará seu horror visceral do envelhecer e da morte.

Sua única companheira certa até os últimos dias, será sua eterna insatisfação por um dia ter que deixar de existir.

Carregando esse fardo, o ser homem irá crescer, se desenvolver; irá conhecer muitas coisas que as outras pessoas tem a lhe oferecer, boas e ruins, e muito pouco de tudo o que a natureza, sem pedir nada em troca, tem a lhe dispor.
Com o peso dos anos, aquele que um dia foi apenas uma ingênua fonte de necessidades, se tornará um jovem revoltado que sabe pouco de poucas coisas e acha que sabe muito de tudo. Esse jovem ansiará por liberdade, e por muitas coisas que ele se achará merecedor de ter, mas que injustamente lhe parecem tão distantes.
Procurará outras saídas, quebrará padrões e desejará amargamente não ser como seus pais.
Esse jovem será julgado, e será chamando de imaturo. Então o mundo apontará o dedo em sua cara e lhe dirá implacável: VOCÊ NÃO É MAIS CRIANÇA, CRESÇA!

E ele cresce.

Em meio a obrigações, compromissos, futilidades e necessidades, sua revolta jovial rapidamente se perde, e seus ousados ideais de vida e futuro logo se dissipam, sobrando apenas um adulto preocupado e acomodado.
Esse adulto casará, terá filhos, usará religião para estar mais acomodado do que nunca, se entupirá de parafernálias e se matará de trabalhar para pagar as infindáveis contas.
Sua vida se tornará monótona e rotineira, suas relações se tornarão complicadas, e como todo adulto passará a vida se esforçando para seguir os padrões, tornando-se, por isso, uma pessoa insatisfeita e profundamente frustrada.
Então quando se dá por si, o ser humano, que um dia já foi uma criança cheia de energia, envelheceu.

A cada dia, um pouco da sua vida se ia com o pôr-do-sol, e infinitas possibilidades presentes eram desperdiçadas a cada nascer de sol.

Na velhice, o ser estagna quase totalmente. Sua saúde se definha, a cada mês uma nova doença e a cada semana novos remédios. Aceita sem resistir que seu corpo aos poucos o abandone, e também não se importa que sua mente se entregue às leias da inércia. Não há mais filtro para suas emoções e seus ressentimentos vêm aos montes.
Então sobra um velho, débil, frágil e ranzinza. Cheio de ignorância e mesmices.

Eis que certo dia aquela que é tão temida e indesejada vem o visitar; a morte.
Fatalmente ela sorri para o ser humano, assim como para todo ser vivo.
No ato final, o homem presencia seu dia mais intenso, sua vida pareceu eterna, mas nesse instante ele vê que tudo não passou um lampejo no céu.
Mergulhado na mais profunda solidão, ele suspira pela última vez o alívio de enfim, retornar ao útero de sua grande progenitora: a Energia Mãe.
O Universo, o Cosmos, ou Deus, como assim o preferir chamar.

Mas e seus filhos?
Seus filhos, netos, bisnetos, ah, é só voltar ao início da história...

A não ser, que você queira escrever um novo texto.
Uma nova história.
Uma nova vida.
O final será sempre o mesmo, não adianta se iludir, ela sempre vem. Mas ninguém precisa passar seus dias reescrevendo a mesma e velha chatice tão conhecida por tantas gerações.
Ninguém é eterno pra se dar o luxo de deixar sempre a desejada mudança, por menor que seja ela, para amanhã...

Não era em jargão, nem lição de moral, que eu queria terminar o texto, mas pessimismo cansa.
Cansa também tentar resumir, tentar comer palavras e espremer frases, porque a maioria das pessoas tem preguiça de ler mais do que uma página ( eu sei que provavelmente você rolou a página pra ver o tamanho do texto, tudo bem, eu também faço, mas sinceramente, eu me envergonho disso).
Cansa ouvir tudo e todos ao redor gritando em desespero por mudança e atitude, e sentir impotência por nada poder fazer. Então eu tento.
E não é nada o que eu faço, mas estamos sempre tentando fazer valer nossos medíocres esforços. Muito medíocres por sinal.

Então aqui vai uma canção, que particularmente me toca bastante. São os resquícios de uma juventude passada, aquela dos nossos pais, cheias de ideais, mas que como quase sempre acontece, se esvairiu com o passar dos anos...

Como nossos pais (Belchior)

Não quero lhe falar,
Meu grande amor,
Das coisas que aprendi
Nos discos...

Quero lhe contar como eu vivi
E tudo o que aconteceu comigo
Viver é melhor que sonhar
Eu sei que o amor
É uma coisa boa
Mas também sei
Que qualquer canto
É menor do que a vida
De qualquer pessoa...

Por isso cuidado meu bem
Há perigo na esquina
Eles venceram e o sinal
Está fechado prá nós
Que somos jovens...

Para abraçar seu irmão
E beijar sua menina na rua
É que se fez o seu braço,
O seu lábio e a sua voz...

Você me pergunta
Pela minha paixão
Digo que estou encantada
Como uma nova invenção
Eu vou ficar nesta cidade
Não vou voltar pro sertão
Pois vejo vir vindo no vento
Cheiro de nova estação
Eu sei de tudo na ferida viva
Do meu coração...

Já faz tempo
Eu vi você na rua
Cabelo ao vento
Gente jovem reunida
Na parede da memória
Essa lembrança
É o quadro que dói mais...

Minha dor é perceber
Que apesar de termos
Feito tudo o que fizemos
Ainda somos os mesmos
E vivemos
Ainda somos os mesmos
E vivemos
Como os nossos pais...

Nossos ídolos
Ainda são os mesmos
E as aparências
Não enganam não
Você diz que depois deles
Não apareceu mais ninguém
Você pode até dizer
Que eu tô por fora
Ou então
Que eu tô inventando...

Mas é você
Que ama o passado
E que não vê
É você
Que ama o passado
E que não vê
Que o novo sempre vem...

Hoje eu sei
Que quem me deu a idéia
De uma nova consciência
E juventude
Tá em casa
Guardado por Deus
Contando vil metal...

Minha dor é perceber
Que apesar de termos
Feito tudo, tudo,
Tudo o que fizemos
Nós ainda somos
Os mesmos e vivemos
Ainda somos
Os mesmos e vivemos
Ainda somos
Os mesmos e vivemos
Como os nossos pais...


( Música na voz de Elis Regina, canta com o coração )
http://www.youtube.com/watch?v=2qqN4cEpPCw&feature=related

P.S.: Fica aqui meus parabéns, a quem leu sem rolar a página, não se preocupando se o texto é longo, isso é um sinal de nem tudo está perdido...:)

21 comentários:

  1. muito lindo teu texto...
    é uma merda pensar que as pessoas, no final, vão ser só cópias do que tanto criticavam, com aquela mentalidade de "bem, um dia eu teria que cair na real". Essa "real" que esmaga e tritura os sonhos, coloca-os em pequenos baús para serem abertos quando quiserem lembrar de sua juventade. Enchendo a boca pra dizer que fizeram sua parte, e agora é hora dos mais novos...
    Não há como culpá-los, ainda não chegamos nessa idade. Poisé... nadar contra a maré cansa.

    www.deixaajanelaaberta.blogspot.com

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  2. isso é tão desanimante,não morrer, mas viver sem propósitos. E não estou falando de propósitos como; um salário digno.
    Mas, sei lá, coisas novas... Vejo as pessoas tão desanimadas com tudo. Voce olha pros lados e vê gente entediada, procurando algo pra se distrair. Ai quando me dou por mim, eu estou assim também...
    Pior de tudo é que até a juventude já está acomodada, nem revolta há mais.
    Parece até doença isso.
    Espero nunca cansar, pra um dia não ter que acordar e perceber que realmente não há saída, que eles tinham razão,que somos iguais aos nossos pais. x/

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  3. Olá! ^^

    Eu li o texto todo! Depois de ter rolado a barra... rs, mas é mais por curiosidade, acredito eu que quando o texto é bom, ele se "encurta" automaticamente, pois lê-se bem com fluidez. :) e o seu texto foi bem fácil de ler.

    Eu pensei em tantas coisas! Lembrei de textos do Chaplin, Camus, Sartre..

    Sabe, a vida pode parecer um repeteco, de certa forma, é, quase ninguem para pensar sobre ela, rever o que se foi feito afim de evitar os mesmos erros ou de repetir certos acertos.

    Aquela velha frase:

    "quem não estuda a historia está fadado a cometer os erros antes cometidos" algo assim.

    Crescemos aprendendo, uns poucos outros muito, mas sempre o insuficiente, mas o mais importante é que vamos absrovendo ideologias, criamos algumas (as vezes tolas), derrubamos, negamos as que estavam estruturadas, arrancamos como se fosse uma bandeira! E cravamos a nossa, e depois?

    Ironicamente passamos nós a defender os nossos valores e querer fazer deles uma tradição.

    Minha mãe sempre disse:

    "Os revolucionarios de hoje serão os conservadores de amanhã".

    E assim, como disse antes, cometemos os mesmos erros do passado, por não ter estudado a historia de nossos antepassados.

    PS1: :) obrigada pelos coments la no universo-in-verso !

    PS2: Putão vem de puto, que em portugues de portugal quer dizer criança, ou seja , seria um "garotão" um crianção. Nada de putos nem putas de profissão...rs

    ;D Niemi.

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  4. Assim como você, desisti de ser pessimista! Como disse certa vez Ghandi: "Você deve ser a própria mudança que deseja ver no mundo".
    E a propósito, "Como nossos Pais" é minha música favorita...

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  5. Niemi
    Também concordo que nossa passado é uma grande lição pra evitar muitos erros! até porque alguns parece que já vem embutido na genética rs -.o

    Não sou dada a revoltas,não é tanto pelas ideologias, até porque todas parece que falharam ( se bem que depende do conceito de falhar ). Talvez seja pela vontade de ver muita coisa mudar. De sentir que as pessoas buscam mudanças e se mexem pra isso.
    Ou talvez, esse pensamento não passe de uma contradição; "não sou de revoltas, mas quero ver revoltas" ( estou tendendo a cada vez mais acreditar nisso, rs)


    "Os revolucionarios de hoje serão os conservadores de amanhã".
    Isso a história mostra melhor do que ninguém né. :/ vou pensar melhor nisso :) hehe
    ----

    "Você deve ser a própria mudança que deseja ver no mundo".
    Concoordo de novo :D:D

    Minha musica preferida também ^^
    Bom gosto !!

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  6. Existe uma razao para q o maior sucesso virtual atual nos de apenas 140 caracteres para nos expressar ... se eh q vc me entende hehehe

    Dah uma passada no meu blog: ArtCulando
    http://artculando.wordpress.com
    Valew
    =)

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  7. auehauheuahaue booa,
    eentendo beem essa razão -.o

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  8. kara eu simplesmente me APAIXONEI pelo seu blog e a sua escrita!!
    to te seguindo =]

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  9. kanto ao texto prefiro naum comentar e estragar a otima leitura que acabei de ter >.<
    (amei o ps q tu coloco no final)

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  10. *_________* fico muuito feliz com isso!!
    valeu, valeu ,valeu!

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  11. A vida é um ciclo, que considero maravilhoso mesmo com tantos altos e baixos. Acredito que cada um faz a sua história, mesmo sabendo que o final é igual para todos. O diferencial é a forma como vivemos a nossa vida. Devemos fazer a nossa história, sendo ela única.
    Adorei o post.
    Obrigado pela visita e pelos belos comentários nos meu blog.
    Abraços.
    Fabiano

    http://blog-do-faibis.blogspot.com/

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  12. olá!
    grande texto, e não digo isso por seu tamanho, mas pelo seu conteúdo!
    só não entendi um paradoxo do texto: você diz que o pessimismo cansa, quando seu texto inteiro se infla com carga pessimista! '-'
    talvez seja uma ironia proposital, afinal, assim é o ser humano, reclamando de quem reclama, criticando as críticas, acomodando-se com os acomodados.

    Enfim, vou confessar que gosto mais de textos que tentam pegar as partes boas de se viver, e repare que não estou dizendo que seu texto é ruim, pelo contrário, muito bom mesmooo, só estou dizendo que gosto mais dos encantos do que dos desencantos explícitos da vida :]

    e não se preocupe com o tamanho do texto, sei que isso encurta a vontade das pessoas de lerem, mas sempre tem quem lê!
    eu mesmo recebo reclamações no meu blog por textos grandes, já encurtei umas duas vezes ¬¬
    se quiser, passe lá também:
    http://songsweetsong.blogspot.com/

    abraço :)

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  13. Me identifiquei com sua forma de escrever.

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  14. Oie ^^

    Voltando, acho que o problema da vida está nas constantes inserções de detalhes, já reparou que desaprendemos a resolver tudo com um simple sim ou não?

    =D avisa quando escrever algo novo hein ;D

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  15. Gabrieel; boa observação -.o
    Na verdade, ia terminar o texto na parte em que para saber o destino das gerações seguintes era só voltar no início do texto. Até ai era mesmo pessimismo explícito...
    Mas deu vontade de continuar, dar uma saída, uma opção ( ao menos no papel) pra quem não deseja seguir o mesmo caminho. Apartir dai achei estar sendo otimista... Mas relendo, acho que a música que citei não se enquadrou muito com a itenção do 'otimismo'. haha acabo tendendo ao pessimismo mesmo...
    Mas sei lá, penso que otimismo sem senso crítico, sem uma visão realista, acaba virando idealismo meio que cego e ingênuo, considerando que a maré tende a nos arrastar... Ao menos na teoria né.
    Se bem essa história de "visão realista" é muito relativa. A muito tempo sábios( citação no comentário do sandro ) já falavam isso e hoje a ciência moderna vem reedescobrindo que a realidade somos nós mesmos quem criamos...
    Enfim, há casos e casos, cada um tem sua forma de processar, compreender e agir na vida...
    Seja como for, estou disposta a reavaliar minha forma :) então valeu pela sinceridade dos comentários!

    Niemi;
    Fato.
    A vida se complica, porque, intelectualmente, ou na prática mesmo, a gente acaba complicando ela. ¬¬ hehehe
    Mas acho que faz parte da 'evolução' humana né...

    Abraço

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  16. Pô Carol você é demais!

    Comentário de Eliane Bee Boldrini

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  17. meu deus eu estou apaixonada por seus textos é claro rsrsrsrs.Eu não consigo parar de ler ,olha que eu to com fome rsrsrs,mas quero ler mais....
    meu marido quer janta mais eu quero ler mais....
    axo a vida xata ela sempre se repete,sei que cada um interpreta seu texto de uma maneira,eu vejo apenas verdade,o ser humano nasce crece apodrece e morre,pois essa vida louca leva muitos a podridão!!! consumismo,cansaço ,mais o ficio nunca no deixa parar de comprar e depois trabalhar loucamente pra pagar,e não ter tempo nem au menos de olhar no rosto de nossos filhos

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  18. Ana... esse é o ideal imposto pelo sistema, infelizmente é o estilo de vida predominante.
    Fico pensando... O Sistema é criado pelas pessoas, pessoas impoem isso a outras pessoas e a si mesmas, por que se sujeitam a isso? Por que nos sujeitamos a isso? Se é algo que faz tão mal... Está faltando opções, ou nós que não nos empenhamos para procurá-las... :/

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